terça-feira, 3 de julho de 2007

13

Em Lisboa, o Sol já se tinha posto há algumas horas quando Eduardo deixou a noiva em sua casa, depois da viagem de regresso do Porto. Antes de sair do carro, disse Leonor:

- Portanto, tu não és pai de facto deo Tomás, mas apenas pai de direito, não é?

- Sim, docinho, é isso mesmo. A Carla explicou-te tudo como se passou, melhor do que eu seria capaz. Um dia ela telefonou-me, alterada, e pediu-me para nos encontrarmos. Contou-me que um colega da escola perdido de bêbado se tinha servido dela a seu bel-prazer, que ela nem sabia o que lhe tinha dado, mas que o mal já estava feito e que, o que era pior, ela tinha engravidado por causa disso e ele dizia não se lembrar de nada. Cá para mim, se queres saber, ele sabe muito bem o que fez, porque um homem não esquece uma coisa dessas...

- Nem bêbado?

- Se estivesse suficientemente bêbado para se esquecer, também estava demasiado bêbado para conseguir consumar o acto, é o que eu acho, não que fale por experiência própria.

- Sim, meu príncipe, já sei que és muito bem comportadinho, e é assim que eu gosto de ti...

- Mas pronto, dizia eu que ela se viu com um bebé para nascer e um pai que não se lembrava de nada.

- E por que foi que ela não fez testes de ADN para determinar a paternidade?

- Pois, foi o que eu também lhe sugeri, mas os pais dela quiseram abafar a coisa o mais possível, e, para fazer os testes, era preciso meter processos em tribunal e eles tiveram medo de que a notícia se espalhasse. Sabes como é, uma família conhecida e influente do Norte, que como tu sabes é muito mais conservador do que Lisboa, não podia dar-se ao luxo de ter uma adolescente grávida na sua pura árvore genealógica... - Eduardo pronunciou as últimas palavras da sua frase com um tom particularmente amargo. Continuou: - Aliás, acho que ela disse aos pais que nem sabia quem era o pai do filho; não sei como eles engoliram essa. O choque de verem a filha grávida aos dezasseis anos deve ter sido tal que nem reflectiram na estranheza de ela não saber quem era o pai. Afinal, a Carla nunca tinha sido do género de andar com muitos rapazes (para dizer a verdade, nunca lhe conheci nenhum namorado, mas pode ser que não me tenha contado dessas aventuras), muito menos de poder estar confusa quanto a quem seria o pai da criança. Mas pronto, ela acabou por me falar para eu assumir a paternidade, visto que a Lei Portuguesa não permite que uma criança seja registada sem pai. Na altura, eu era mais novo e inconsciente do que sou hoje e disse que sim.

- E assim ganhaste um filho sem teres feito nada por isso.

- Ora nem mais! - exclamou Eduardo.

- Está certo. Mas explica-me uma coisa: do ponto de vista legal, tu és o pai dele, não é?

- Sim, sou eu.

- E se se vier a saber que o pai biológico é outro? O Tomás passa a ter dois pais?

- Não, trâmites legais à parte, o resultado prático é que eu deixo de ser pai.

- Estou a ver...

Despediram-se com um beijo rápido e Leonor entrou em casa.

No Porto, a enfermeira da Unidade de Cuidados Intermédios notou no seu monitor o aumento da frequência respiratória de Miguel. Levantou-se e foi até à cama onde este se encontrava deitado a dormir e notou uma certa dificuldade na respiração. A enfermeira saiu do quarto e foi chamar o médico do serviço. Quando este voltou, Miguel tinha acordado e queixava-se de dores nas costas.

- Ele foi operado ontem pela Ortopedia, não foi? - perguntou o médico à enfermeira.

- Sim, senhor doutor. Tinha várias fracturas nos dois fémures e num dos antebraços.

- Pois... Acho melhor pedir umas análises e uma TAC. Vou fazer a requisição; pode ir preparando o material para colher o sangue.

Dito isto, quer o médico, quer a enfermeira se afastaram da cama de Miguel, que os chamou de volta e perguntou:

- Mas, senhor doutor, o que é que eu tenho agora?

- Ainda não sabemos, por isso é que vamos fazer as análises que lhe vou pedir e vai fazer a TAC.

- Mas deve ter alguma suspeita, não é? Eu gostava de ser informado sobre o meu problema e de saber o que me fazem enquanto aqui estou, se não for pedir muito - Miguel arrependeu-se imediatamente das últimas palavras, com medo de ser mal interpretado pelo médico, mas já estava dito, era tarde demais.

O médico franziu o sobrolho, olhou para a enfermeira e retorquiu agastado:

- Senhor Miguel, eu não lhe posso dizer o que o senhor tem, porque não sei o que é. Suspeito de que possa ser um tromboembolismo pulmonar, mas só depois dos exames é que vou ter a certeza.

- Um quê?

- Uma embolia pulmonar, já ouviu falar? O senhor foi operado, está deitado numa cama, imobilizado, tudo isso aumenta o risco de que se formem pequenos coágulos nas suas veias, principalmente nas pernas, que depois podem ir pelo sangue e encravar nos pulmões. É isso que vamos conferir com os exames que lhe vou pedir. Tem mais alguma dúvida?

- Já ouvi falar de muita gente que morreu disso...

- Não se preocupe, que nós vamos tratá-lo bem. Até já.

Miguel não falou mais e concentrou-se na sua dor. O médico e a enfermeira afastaram-se conferenciando entre si:

- Senhora enfermeira, a TAC só é feita amanhã de manhã, não é?

- Sim, senhor doutor.

- Então olhe, vou pedir também para começar já o tratamento com heparina, que é melhor não facilitar. Operado ontem, ainda por cima por Ortopedia, com este quadro... Tenho quase a certeza de que a TAC me vai dar razão. Bem, vou passar as requisições. Até já.

A dez quilómetros dali, Carla não conseguia adormecer; pensava e pensava na conversa que tiveram horas antes com a noiva de Eduardo, em que lhe explicara toda a história a respeito do nascimento de Tomás e como o primo se tornara o Tio Dado. Estava à espera duma reacção diferente da parte de Leonor. Na verdade, até lhe estava a parecer fácil demais; contara com alguma incredulidade, raiva, talvez incompreensão, mas, afinal, Leonor mostrara-se pouco surpreendida e aceitara com naturalidade a situação e, o que é mais, o desejo de Carla de manter o segredo apenas entre os três. Pensava também na pergunta de Tomás, “Mamã, porque é que os outros meninos têm um Papá e eu não”, e em como lhe responder. Não gostava de ter de mentir ao filho, mas havia mais em jogo.

10 comentários:

B disse...

Em termos de enredo continua a "prender-nos" à história... Mas os atrasos começam a ser imperdoáveis e... vamos lá a ver se ficamos mais inspirados na escrita, sim? "docinho"?! "meu principe"?!... Parece-me um pouco demais!

GMSMC disse...

Bárbara,

Tens razão, os atrasos começam a ser imperdoáveis e vamos ver se nos emendamos. Espero que o facto de escrevermos por prazer e nos tempos livres sirva como atenuante; nem sempre a vida profissional nos deixa escrever como gostaríamos.
Quanto à crítica directa que me teces, apenas te posso dizer que já me chamaram príncipe e eu já chamei docinho. Serei o último romântico?

Beijinho,
GMSMC

Anónimo disse...

oh Barbara!
Porque é que não vais ajudar o rapaz, a ver se ele assim se despacha.... e davas-lhe algumas sugestões de nomes mais bonitinhos para ele pôr na história?
Que dizes?è boa ideia, assim, tamém te entretinhas um bocado, pois pelo comentário que fizeste, não me parece que tenhas muito pa fazer....

Anónimo disse...

bem, cag**em la nisso, as mariquices não são importantes.... já ouviram falar de marketing directo?? o que é certo é que continuam a prender-nos... e bem!
parabéns aos dois, espero atentamente por amanhã... beijos, meu principe docinho!!! LOL

Anónimo disse...

Pois, um bocadinho t�cnico, nao? inspirado no House? :) Fora de brincadeiras, continuo com curiosidade face ao acidente... o que v�o voces inventar? e ja agora, a Leonor nao esta a tramar nada, n?
Boa continua�o

B disse...

Olá anônimo..

Pelos vistos o nosso grau de entretenimento é o mesmo, não achas?
Se eles se comprometeram a publicar à quinta e à terça têm é que o fazer e se não fizerem temos é que "reclamar"... Os compromissos devem ser cumpridos, certo?
Já agora é um bocado cobardia não te identificares... Tens algum problema em que se saiba que andas a ler esta história?

Maria disse...

Vá meninos, vamos lá a acalmar os ânimos. Pode ser???

Perto da meia noite o XIV estará publicado!

Beijinhos,

Maria

Anónimo disse...

olá Barbara!
Sou o anónimo...e chamo-me Salete. Só não me identifiquei porque perdia mais tempo com isto.
Como vês não tenho medo nenhum em me identificar e em dizer que leio esta história.
Ontem fiz este comentário na palhaçada, e realmente tá exagerado.
Por isso queria-te pedir desculpa, até porque, na altura, também achei que, principalmente, a parte do docinho era exagerado.

B disse...

Salete,

sem stress tudo na boa! Afinal estamos aqui para descontrair um pouco e ler esta história fantástica! E temos que reconhecer que eles até têm jeito para a coisa...
Eu já estou ansiosa pelo próximo. E tu? Qual é o futuro que a Maria lhes reserva? ;)

GMSMC disse...

Tiago,

Deixa-me que te diga que fazes uma pergunta muito pertinente. A curiosidade da Leonor é no mínimo suspeita, não é?

Abraço,
GMSMC