quinta-feira, 12 de julho de 2007

16

- Carla? Sente-se bem? – perguntou Ricardo num misto de preocupação e surpresa.

De um momento para o outro o olhar daquela mulher tinha-se ensombrado, como se uma nuvem escura pairasse sobre si.

- Desculpe, Ricardo. Mas, de repente, lembrei-me de uma sensação estranha que tive hoje pela tarde e que me levou, impulsivamente, ao Colégio do meu Filho, só para o abraçar. – respondeu-lhe Carla, tentando desviar o rumo da conversa.

“Um Filho?”, questionou-se Ricardo a si mesmo. Depois lembrou-se da cadeira de transporte de crianças que tinha visto no carro de Carla, e tudo fez mais sentido. E logo um sem número de interrogações assaltaram a sua mente.

- A Carla tem um Filho? Que surpresa! Não pensei que fosse casada. É que como não usa aliança, julguei que fosse solteira. – disse Ricardo, na tentativa de perceber melhor alguns dos mistérios daquela mulher que o prendia por algum motivo que desconhecia.

- Sim, tenho um Filho de 6 anos. Chama-se Tomás. É o homem da minha vida. E não, não sou casada. Aliás, nunca fui. Sou Mãe solteira.

“6 anos?”, interrogou-se, novamente, Ricardo. “Mau”, pensou, “há aqui qualquer coisa que está a escapar-me. Quer-me parecer que a história desta mulher de linear e banal não tem nada.”

- Mas, e vai desculpar-me o facto de ser tão directo, isso quer dizer que foi Mãe com 17 anos. Um namoro que não resultou? – tentou, mais uma vez, Ricardo puzar o fio do novelo de mistérios e segredos que cada vez mais lhe parecia envolver Carla.

- Não foi um namoro falhado. Foi mais um amor não correspondido, que acabou por me dar o que de melhor tenho na vida – o meu Filho!

Naquele momento percebeu que Carla amava o Filho mais do que tudo na vida, que era por ele que vivia e que por ele seria capaz de tudo. Sentiu-se tocado com a imensidão do amor de Carla por Tomás. Mal conhecia aquela mulher, mas cada vez mais sentia necessidade de aprofundar o conhecimento superficial que naquele momento tinha com aquela mulher.

- Hummm, estou a ver. Um idiota, por tanto. Sim, porque só um idiota não corresponderia ao amor de uma mulher tão bonita e interessante como a Carla. Perdoe-me a franqueza, mas contra factos não há argumentos, e é assim que a vejo. E mal a conheço... – disse Ricardo, deixando Carla quase sem resposta.

- Não se deixe iludir pelo que vê, Ricardo. Nem sempre fui uma mulher bonita e interessante, como acabou de me descrever. Os anos e a vida fizeram de mim aquilo que sou hoje, mas já fui o “patinho feio”. – respondeu Carla num misto de tristeza e mágoa.

- Só falta dizer-me que era gozada no Colégio!

- Agora já não preciso de dizer. O Ricardo acabou de o fazer...

- Parece que meti o dedo nalguma ferida. Peço desculpa. Não era minha intenção. Mas fale-me do homem da sua vida. – pediu Ricardo tentando redimir-se.

Carla começou a falar do Filho e o seu semblante mudou. Os seus olhos iluminaram-se e o tempo voou. Falou do nascimento de Tomás, e da experiência de ser Mãe com 17 anos. Falou dos primeiros passos do Filho, das primeiras palavras, do primeiro dia de escola, do primeiro dente que lhe caiu. Quando se deram conta já eram horas de ir embora.

Como um bom cavalheiro, Ricardo pagou o jantar, puxou-lhe a cadeira e segurou a porta para que ela saísse. Já do lado de fora, deram o braço e caminharam lentamente até ao carro. Era estranho, mas sentiam-se bem um com o outro. Parecia que estarem ali, naquela noite amena de Primavera, de braço dado, era a coisa mais natural do mundo.

Nisto, Carla recordou-se que o homem com quem estava a sentir-se tão bem era, nada mais nada menos do que, o melhor amigo de Miguel, e um dos rapazes que nos tempos de Colégio lhe chamava “Freira”. Um arrepio percorreu-lhe o corpo e Ricardo sentiu-a tremer.

- Está com frio? Deixe-me tirar o casaco. – disse-lhe Ricardo.

- Não é necessário. Leve-me à empresa para eu ir buscar o meu carro, por favor. Já está tarde e amanhã é dia de acordar cedo.

Sem reclamar, Ricardo encaminhou-a para o carro para a levar ao seu destino. Quando estacionou à porta da empresa, Ricardo segurou no braço de Carla e pediu-lhe:

- Prometa-me que vamos voltar a sair juntos. Esta noite foi, simplesmente, fabulosa.

- Não sei se será boa ideia, Ricardo.

- Prometa-me, Carla. – insistiu Ricardo.

- Prometo. Agora deixe-me ir, por favor Ricardo, é o melhor. – e dizendo isto saiu do carro de Ricardo e entrou na garagem da empresa.

Já no seu carro, Carla encostou a cabeça no banco e fechou os olhos. Aquilo era uma loucura. Mas depois daquele jantar tinha ficado cheia de vontade de conhecer melhor Ricardo. Aquele não parecia nada o melhor amigo de Miguel, de quem se lembrava dos tempos de Colégio. Percebia, naquele momento, que o melhor havia sido mesmo não revelar-se. Pelo menos por enquanto. Mas a verdade logo viria à tona. E cada vez mais sentia que esse dia estava perto.

Era hora de ir para casa. Aquele dia tinha sido longo demais. E ainda tinha de pensar como iria livrar-se da festa do Colégio.

4 comentários:

Anónimo disse...

UOUU!!! :) é capaz de ser a teu melhor capitulo ate agora (na minha singela opiniao). o modo como descreves as emoçoes quase que da pra VER o que se passa ALI. Muito bem!

GMSMC, nao fiques ciumento! ;)

Maria disse...

Tiago - Muito obrigada pelo elogio. Nem sei o que dizer. Ainda bem que gostaste!

Beijinhos,

Maria

B disse...

Realmente muito bom....

Maria disse...

Bárbara - Vocês assim, com esses alogios, deixam-me sem palavras...

Mas ainda bem que gostaste!

Beijinhos,

Maria